Por Carlos Eduardo Carvalho*
O impacto da IA no posicionamento de produtos na indústria de alimentos
Historicamente, a indústria de alimentos e bebidas investe quantias significativas em pesquisa e desenvolvimento (conhecido como P&D). Com a concorrência cada vez mais acirrada e os perfis de consumidores em constante transformação a cada nova geração, posicionar produtos blockbusters e mantê-los em alta é um desafio de grande escala.
Quando falamos de tecnologias capazes de encurtar o tempo de pesquisa e, por consequência, reduzir o montante de investimento necessário até chegar a novos produtos, o tema ganha atenção da camada executiva dessas empresas.
As lideranças do setor estão cada vez mais abertas a entender o impacto da Inteligência Artificial Generativa (GenAI) em suas cadeias de pesquisa e produção. Casos concretos de mercado já demonstram que o uso da GenAI traz ganhos significativos. Antes considerado um mercado de difícil acesso devido às altas barreiras de entrada, a Inteligência Artificial passa a viabilizar novos entrantes que possuem competências centrais vinculadas às tecnologias digitais.
Como a AI está sendo usada por essa indústria?
No meu último artigo, apresentei uma análise sobre a hipersegmentação e como ela se tornou fundamental para que, hoje em dia, empresas alcancem diferentes nichos de clientes.
A Inteligência Artificial é o motor principal que viabiliza essa segmentação mais avançada, pois trabalha com grandes volumes de dados e consegue criar relações para além do básico. Cada vez mais, empresas de alimentos e bebidas precisarão de competências em dados para trabalhar a hipersegmentação, dado o crescente número de perfis específicos, como os low-carb, veganos, vegetarianos, gourmet, nostálgicos, fit, paleo, entre outros.
Em paralelo, a GenAi vem sendo usada para apoiar a criação de novos sabores e aromas que atendam a necessidades e gostos específicos dos perfis hipersegmentados. Empresas como a NotCo desenvolveram um algoritmo proprietário especializado em replicar texturas, sabores e aparência de alimentos de origem animal a partir de fontes vegetais.
Além disso, seu algoritmo cruza dados de química alimentar, percepções e preferências dos consumidores, e características sensoriais para propor novas fórmulas. É sobre esse encurtamento dos tempos e redução de gastos em P&D que me referi anteriormente.
Na Suíça, temos dois cases interessantes a destacar. A Givaudan é uma empresa especialista na criação de sabores e fragrâncias por meio do uso intensivo de tecnologia. Seus algoritmos de simulação conseguem estimar com alta precisão os impactos de novos aromas e sabores em um conjunto populacional, sem a necessidade de produzi-los em laboratório e realizar testes do tipo AB, por exemplo. A eliminação da necessidade de produção de lote teste e a simulação dos impactos via Inteligência Artificial trouxeram ganhos significativos para a empresa.
A DSM-Firmenich, mundialmente conhecida pela sua capacidade de P&D no design de sabores e fragrâncias, utiliza há anos modelos de Inteligência Artificial que sugerem combinações moleculares inovadoras com base em uma vasta fonte de dados. Esses dados variam desde características químicas de componentes até preferências sensoriais de consumidores, segmentados, inclusive, por traços regionais e culturais.
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O papel central dos dados na estratégia de Inteligência Artificial
Os três exemplos anteriores de empresas que já obtêm ganhos pelo uso de IA em seus negócios têm algo em comum: possuem maestria na coleta, armazenamento e tratamento de dados.
Por mais que seja algo frequentemente mencionado, a maestria em dados ainda é pouco vista em larga escala nas empresas. Para atingir esse patamar, as empresas precisam tomar decisões estratégicas na alta camada executiva – decisões estruturais que iniciarão uma jornada de mudanças tecnológicas, culturais e processuais.
Empresas da indústria de alimentos e bebidas que querem triunfar na nova economia precisarão incorporar essas competências de forma integral, tornando-se empresas de fusão, usando o termo do autor e especialista no tema Venkatraman. Uma de suas últimas obras (denominada “Fusion Strategy”, da Harvard Business Review Press) fala sobre como indústrias clássicas precisarão se fundir com o pensamento digital para manter-se competitivas.
A próxima pergunta-chave que você precisa responder é: quão pronta sua empresa está para se tornar uma empresa de fusão? Como está seu nível de preparação para combinar suas capacidades de produção real com novas competências digitais, empoderadas por IA? Essa pergunta define os próximos anos da sua competição.

*Autor: Carlos Eduardo Carvalho, Sócio-Diretor e CEO da Bridge & Co.
Fundador e CEO da Bridge & Co., é Engenheiro de Produção e Mestre pela COPPE/UFRJ. Possui MBA Executivo pela Fundação Dom Cabral e especialização em Plataformas Digitais pelo MIT. É especialista em Business Transformation com ênfase em automação de processos, análise avançada de dados e Inteligência Artificial. Atua também como palestrante, autor e professor de pós-graduação em instituições como UFRJ, FGV e UFJF.
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